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Salinas: MP questiona liberação de prédio em frente à praia

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Uma legislação aprovada em maio deste ano pela Câmara de Vereadores de Salinópolis e logo sancionada pelo prefeito Kaká Sena (PL), que aumenta de nove metros para 65 metros de altura o limite para construção habitacional em uma única quadra em frente à praia do Atalaia, motivou o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), em documento assinado pelo procurador-geral de Justiça, Cesar Mattar Jr., a entrar com Ação Direta de Inconstitucionalidade. A ação foi protocolada em agosto contra a prefeitura e o parlamento da cidade no intento de suspender a aplicação da lei. O processo, com mais de 200 páginas, cita como justificativas principais a ausência de estudos de impactos ambientais prévios à análise e aprovação do texto, de realização de audiências públicas e ainda o fato de que a matéria, aprovada como foi, beneficia no momento, única e exclusivamente, a Estrutura Engenharia, anunciante de um empreendimento imobiliário de 22 andares, de finalidade habitacional somente, e que seria o mais alto de Salinas até hoje.

Aprovado no dia 2 de maio com maioria de votos dos 13 vereadores que compõem o parlamento municipal, presidido pelo vereador João Erivaldo da Silva (PDT), o projeto 02/2023, apresentado pela Mesa Diretora da casa ainda em março, foi sancionado exatos 16 dias depois da aprovação, no dia 18, como lei municipal 2.949/2023, que “altera o Anexo II, do Parágrafo único do art. 10 da lei municipal n°2.896/2017, reclassificando a altura do gabarito de construções para fins habitacionais do Plano Diretor do Município, do loteamento Balneário Ilha do Atalaia II, quadra 38, lotes de 01 a 14”.Um ponto que merece destaque é que a autoria do projeto é da própria Mesa Diretora da Câmara, com a assinatura do presidente e dos vereadores Argeo Correa Neto (MDB, 1º secretário) e André Luiz de Barros (PL, 2º secretário). Sem qualquer detalhamento, o texto informa que ali “a altura máxima permitida será de 65 metros, a partir do nível da calçada externa até o piso do último pavimento habitável”. A justificativa do projeto informa que “a altura dos empreendimentos (…) vem impedindo o crescimento turístico e geração de empregos no município”.Conteúdos relacionados Estado vai construir novos espaços na Feira da CohabTerras da Agropalma no Pará são invadidas pela terceira vezNo processo, é sustentado que a matéria é “formalmente e materialmente inconstitucional” por violar três artigos da Constituição Federal – incluindo o princípio da impessoalidade (art. 37), a inconformidade ao regramento imposto pelo Plano Diretor Urbano (art. 182) e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225) – e outros cinco da Constituição do Estado do Pará.“É possível verificar que a Zona de Uso Misto – ZUM, no bairro Atalaia II possui extensão significativa (aparentemente 35 quadras), e causa estranheza a eleição de apenas uma única quadra (quadra 38), para ser beneficiada com essa alteração de parâmetros urbanísticos, já que o projeto de lei não apresenta nenhuma justificativa técnica para tal escolha”, informa o processo, com base em análise feita pelo Grupo de Apoio Técnico Interdisciplinar (Gati/MPPA).No processo consta ainda que a relatoria do parecer da Comissão de Terras, Obras, Patrimônio e Meio Ambiente da Câmara Municipal de Salinópolis é favorável ao projeto de lei considerando uma crescente demanda de residentes na cidade, destacando, contudo, que a alteração “(…) terá como parâmetro para a devida mudança os estudos informadores da Política Nacional do Meio Ambiente. (…)”. O parecer do relator foi acatado à unanimidade pela Comissão, mas a recomendação de que as alterações do gabarito deveriam se basear em estudos ambientais foi ignorada.Quer saber mais sobre as notícias do Pará? Acesse nosso canal no WhatsappJá no Parecer da Comissão de Constituição e Justiça, a relatoria argumenta simplesmente que não há ilegalidade na proposta, mas que deve ser assegurado o princípio do poluidor-pagador como forma de que os empreendedores que se beneficiem das alterações urbanísticas propostas deixem contrapartidas de diversas naturezas ao município. Outro argumento utilizado é que o município de Salinópolis “(…) precisa dos investimentos de grandes empresas para melhorar ainda mais o nosso setor hoteleiro e aquecer o setor do turismo do nosso município (…)”. Ou seja: o próprio relator já admite que as alterações urbanísticas propostas no projeto de lei serão geradoras de impactos ambientais negativos, uma vez que considera o uso do princípio do poluidor-pagador. Além disso, o argumento de que o município necessita de melhorias no setor hoteleiro não é cabível no caso, tendo em vista que o único empreendimento contemplado pela legislação 2.949/2023 tem finalidade exclusivamente habitacional/de moradia, não sendo algo voltado ao setor hoteleiro/turístico.É reforçado que não foram realizados debates aprofundados sobre o projeto, mas apenas discutidos os pareceres de ambas as comissões da casa, e ainda que o parecer da Comissão de Economia e Finanças não foi juntado aos autos. 

 A Câmara Municipal de Salinópolis chegou a emitir uma nota pública sobre o assunto informando que foi realizado estudo de impacto econômico social por uma empresa interessada de “notórios argumentos de relevante interesse público e social”, dentre eles a geração de 200 a 300 empregos diretos, 50 indiretos e entre 100 e 150 terceirizados durante o período das obras, além de alcance social entre 380 e 530 famílias (até 2,1 mil pessoas). Porém, encerrada a construção e todos os impactos ambientais em andamento, a previsão do próprio MPPA seria de nada além de 30 empregos gerados.A mesma nota tenta justificar a não elaboração de estudos de impactos ambientais para a alteração legislativa pelo fato do ZUM do bairro da Atalaia ser área de zona de expansão urbana, supostamente sem nenhum risco de dano ambiental ou equivalente – argumento este que, para o MPPA, é “totalmente equivocado”.Além se tratar de zona costeira, a área em questão está na zona de amortecimento de uma unidade de conservação estadual de proteção integral, o Monumento Natural do Atalaia (Mona), criada por Decreto Estadual em 2018, e que conta com uma legislação específica para o uso e ocupação do solo, devendo buscar compatibilização máxima entre as atividades licenciadas e os objetivos de criação da UC.Levando em consideração que Salinópolis enfrenta problemáticas em relação ao saneamento básico e abastecimento de água em diversas áreas, o Ministério Público argumenta que antes de propor a alteração de parâmetros urbanísticos de modo a favorecer o adensamento urbano, deveriam ser estabelecidos critérios de hierarquização dos problemas já existentes associados ao uso e ocupação do solo de forma a definir indicativos de prioridades, assim como analisar a vulnerabilidade dos ecossistemas de praia, verificando os riscos associados às obras que interferem nas características físicas e bióticas dessa zona costeira.Por meio de advogado, Kaká Sena respondeu formalmente ao pedido do MPPA, pedindo que a Adin não seja reconhecida pela Justiça Estadual sob a tese de que “inexiste motivo para a discussão” e que as alterações são legais e de prerrogativa do gestor municipal. O caso está sob a tutela do desembargador Mairton Marques Carneiro para análise.RepercussãoA reportagem do DIÁRIO entrou em contato com o presidente do Conselho Municipal de Turismo de Salinópolis, Marwan Salman, e com o vice-presidente da Associação de Moradores do Farol Velho, Azael Lobato, e ambos possuem entendimentos semelhante: não são contra o tipo de empreendimento proposto pela Estrutura Engenharia, muito embora o mesmo não seja voltado ao setor hoteleiro da cidade, porém defendem que toda e qualquer intervenção do tipo obedeça todos os regramentos e esteja em conformidade com questões de preservação ambiental.“Não somos contra o desenvolvimento, mas há outras necessidades de investimentos antes de uma lei como essa. A prefeitura tem por obrigação preparar a infraestrutura necessária, ampliar o saneamento, fazer estudo ambiental, analisar todos os lados. Salinas não pode trabalhar no rumo errado, porque o desenvolvimento tem que chegar mas com cuidado para evitar impactos ambientais que possam destruir tudo de bom que tenha sido feito”, defende Marwan.Ele conta que tentou questionar, sem sucesso, a prefeitura e a Câmara de Vereadores sobre o projeto, principalmente pelo fato de não ter havido qualquer audiência pública sobre o tema e por se tratar de uma alteração que beneficia apenas uma empresa. “Por que em uma única quadra? O que vale para um tem que valer para todos”, justifica Marwan.“Não é esse o nosso entendimento, a lei existe. O que não foi apresentado foram os estudos de impacto ambiental, estudos de solo e projetos sanitários para receber um empreendimento desse porte”, complementa Azael. “Também não vimos o trâmite desta lei pelas comissões da Câmara de Vereadores”, relata o vice-presidente da Associação de Moradores do Farol Velho.Apesar de ser vereadora pelo mesmo partido do prefeito de Salinas, Luna Brígida (PL) faz oposição ao gestor municipal e afirma que está tão decepcionada com o desrespeito ao regimento interno da casa no que diz respeito a tramitação de projetos e outros encaminhamentos a ponto de não ter vontade de concorrer para um segundo mandato – este é seu primeiro cargo eletivo. Ela afirma ter sido um dos poucos votos contrários ao projeto de lei 02/2023.“O projeto de lei foi apresentado pelo dono da construtora ao presidente da Câmara, e ocorreu que depois disso a Mesa Diretora apresentou formalmente o projeto ao parlamento. Eu questionei os pareceres das comissões, questionei o fato de ser uma lei para uma determinada área e que beneficia uma única empresa, questionei não existir estudo de impacto ambiental. Ocorre que como a maioria dos 13 está com o prefeito, a própria assessoria jurídica da Câmara só trabalha para orientar projetos de interesse da base aliada”, lamenta.Segundo publicações na internet sobre o empreendimento imobiliário, se construído, o prédio ficará a apenas 200 metros da praia e todos os apartamentos terão vista para o mar.“O Fort Litoranium é um projeto de R$ 80 milhões que na sua fase de construção irá gerar na faixa de 300 a 500 empregos diretos e indiretos, gerando renda à população local, com uma previsão de serem injetados quase R$ 20 milhões na economia local, entre estâncias, lojas de material de construção, restaurantes, etc”, explica James Pyles, CEO da Estrutura Engenharia, em uma publicação.

Fonte: DOL – Diário Online – Portal de NotÍcias 

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